segunda-feira, 28 de novembro de 2011

O camarada Bruno

O ano lectivo 2010/2011 foi provavelmente o último em que dei aulas. Realisticamente tenho de o dizer (já o admiti há muito) com toda a amargura que uma brutalidade destas despeja sobre quem o sente. Estive em Alvalade-Sado, Santiago do Cacém, com uma horrenda turma: um PIEF daqueles que...
O Tiago, que ficou em Ourique, a quarenta quilómetros a sul de mim, já glosou o Alentejo e, embora tenha as minhas próprias razões para me deslumbrar com a doce melancolia alentejana bastam-me, por ora, as sentidas palavras do Tiago sobre a sua experiência de além Tejo expressadas no início do Verão.
Em termos de estímulo profissional foi, devo reconhecê-lo, um ano para esquecer, o que não quer dizer que não tenham acontecido coisas interessantes. Uma delas foi, sem dúvida, a visita (estará a fazer um ano) que o deputado Bruno Dias, do PCP, fez aos seus «camaradas» de Alvalade, na altura para falar sobre os PEC's (ainda se lembram?) que o governo de Sócrates ia apresentando, fazendo lembrar aquela coreografia das gaivotas a voar contra o vento forte. Resolvi ir (fazer o quê, naqueles fins-de-semana?).
Para além do próprio Bruno Dias e do presidente da junta , eu era a única pessoa com menos de 70 anos na sala. Talvez por isso (e por ser desconhecido), fui abordado pelo líder concelhio do PCP e pelo próprio Bruno Dias. Embora eu percebesse o alcance da eficácia «organizacional» do aparelho de um velho partido inerente à abordagem que me fizeram, gostei de falar com o Bruno Dias. Simpático e inteligente, impressão que a sua exposição à envelhecida audiência de Alvalade confirmou. Julgo aliás que são assim os deputados do PCP: preparados e aplicados, levam a aua tarefa política a sério, raramente se confundindo com os arrivistas que vão para a política fazer negócio ou encher as fileiras clientelares de algum padrinho.
Mas tanto encómio poderá deixar uma impressão errada: que sou do PCP. Não sou. Não quero ser. Admiro à distância este partido, mas sabem como é: há o Lenine, o Estaline, o Mao, os Kim's da Coreia do Norte (ai O Bernardino Soares!) e coiso. E deixando de lado os facínoras, poderíamos ir para o lado cabotino, referindo Enver Hoxha... Sou de esquerda, mas de outras inspirações... (e não estou a colar irremediavelmente o PCP a estes personagens).
Seja como for, Bruno Dias é um bom deputado e, há uns tempos, fez a cabeça em água ao Ministro Álvaro (coitado dele e de nós que o temos no mando). Entre uns quantos mitos quebrados, fica a cara embaraçada do Álvaro neste vídeo, via Arrastão.

3 comentários:

Tiago Sousa disse...

Nas minhas deambulações pelo tempo livre já fiz o exercício saudosista de retroceder uns meses no tempo e ler os meus textos do blogue sobre o "nosso" por ti referido Alentejo.

Ocorre-me um misto de sensações, quando leio os referidos textos escritos nos meses de Verão.

Nostalgia pois eram tempos diferentes dos actuais, pois havia trabalho e uma luz ao fundo do túnel. Saudade, pois as palavras escritas foram sentidas e quando as dificuldade passam por nós ajudam-nos a crescer tornando-nos diferentes.

Apesar das inúmeras coisas menos boas que ocorreram tento sempre recordar as mais valias da fugaz passagem pelo Alentejo, afinal foram apenas 10 meses.

Tiago Sousa disse...

Prezo em saber da tua "experiência comunista". Sou daqueles que gosta de uma boa conversa, quando bem desenvolvida e sustentada, penso que é isso que nos faz aprender e evoluir.

Há não muito numa tertúlia de amigos, falámos da impossibilidade de o partido comunista, poder entrar no governo, pois as ideias que desenvolve são utópicas.

Fui à festa do Avante, onde obsevei algo único que não há em mais nenhum partido.Ali todos trabalham e há uma interajuda enorme. Não escondo, que me fascinou toda aquela envolvência.

Na minha opinião, todos deviam comparticipar nela nem que fosse apenas umas horas, para saberem o que ela significa.

Tenho a noção dos extremismos que enveredaram, certas ideologias comunistas, que em nada dignificam principios nobres que o actual PC português defende.
No entanto infelizmente a responsabilização da esquerda, por tudo o que de mau tem acontecido ao país e ao Mundo, faz-me crer que infelizmente é impossível, que o PC consiga ter cada vez mais força no parlamento, vingando de uma forma crescente os ideais de direita onde subjaz notoriamente o PP. Foi assim em Espanha, Itália...

É cada vez mais evidente, que iremos viver tempos difíceis, onde os economistas, suportados pelos lobies das grande empresas governarão, havendo cada vez mais dificuldades, fome e insegurança.

Sérgio disse...

Pois é, Tiago. Para além do fascínio natural que o Alentejo exerce, há magna questão de que tínhamos trabalho. E isso faz toda a diferença. Daí a nossa recordação mais filtrada dos tempos do velho Alentejo.

Quanto à questão do PCP, a coisa é um pouco complicada. Não sou daqueles que diabolizo o PCP porque isso seria uma infantilidade improcedente. E entendamo-nos: O PCP é um partido da democracia portuguesa e nela institucionalizado e, juntamente com o BE, uma força de progresso social.

O estigma do PCP pode ter várias origens: a natureza subversiva da sua utopia e o ódio que os Liberais-Conservadors lhe votam; o facto de o marxismo-leninismo ter proposto uma ditadura de classe para se chegar ao socialismo (sociedade sem classes) ou, talvez de forma mais poderosa, as experiências do "socialismo real" terem sido, em muitos aspectos, um crime contra a humanidade. Mas a implosão da União Soviética e o consequente descrédito dos regimes comunistas não foi o "fim da História" nem a gloriosa marcha para uma "nova ordem". Pelo contrário, o desnorte da social democracia europeia e esta fase estridente do neoliberalismo só demonstram a necessidade de um pensamento económico e social de esquerda, descomplexado e renovado, que consigam dar um sentido pleno ao poder do povo.

Ora, o PCP tem de se renovar. Não pode ficar preso a aparatos leninistas de má memória e democraticidade duvidosa, como o centralismo democrático e um totalitarismo interno mitigado (a ideia de que não pode haver posições individuais e que os indivíduos só se podem pronunciar nos moldes colectivamente definidos).