terça-feira, 5 de julho de 2022

Eu e o Duarte

Observo o Duarte! Tenho medo de falhar na educação que lhe transmito. Observo alguns traços meus e deixa-me assustado. Percebo no Duarte ainda muita insegurança, muito medo de falhar, desiste facilmente quando vê que não consegue. Eu sou assim. O Duarte dispersa o pensamento e deixa as tarefas a meio se não for incentivado a acaba-las. Acontece-me isso muitas vezes principalmente quando não estou focado a realizar uma tarefa e as adio ao máximo, pois não tenho um rumo, estou perdido e não sei por onde ir. Hoje o Duarte após tomar o pequeno almoço a mãe mandou-o lavar os dentes e ele passou uma enormidade de tempo na casa de banho, antecipou a tarefa que tinha de fazer, ou esqueceu-se mesmo que era para lavar os dentes. Será que ele também tem receio de ir para a escola de ser confrontado com colegas que o desafiam. O Duarte é mole como eu não reage quando lhe batem ou quando recebe de um colega uma expressão menos positiva. 

Daquilo que me recordo dos relatos dos meus pais sobre a minha pré escola/ ensino primário foi eles dizerem aos professores que eu era muito tímido. Desde sempre gostei de estar no meu canto, na minha bolha. Aquilo que mais me aflige é minha obsessão por definir objetivos constantemente quando algo corre mal. Estar constantemente a partir pedra para tentar chegar a um objetivo que nunca consigo. Quero sempre ser melhor, defino as estratégias, mas quando as implemento e percebo que algo corre mal coloco tudo em causa e volto quase à estaca zero. Considero isso masoquismo! O convívio social e a integração foi sempre o meu calcanhar de Aquiles. Tenho medo de expressar a minha opinião, de tirar as minhas dúvidas pois penso que elas são despropositadas, ou simplesmente porque não me sinto à vontade para falar com aquela pessoa.  Estes serão alguns dos meus defeitos. Percebo que estes defeitos me tornam mais incompetente pois não me pedi ajuda quando o devia ter feito e tomei uma decisão errada que foi alvo de chacota por colegas ou alunos. Colocar-me constantemente na cabeça do outro é tremendamente desgastante e tóxico. Eu percebo  isso mas é a maneira que eu tenho de lidar com as situações principalmente as que correm menos bem. Digo isto tudo porque sei que quando tenho as coisas bem definidas, acredito nelas tudo corre melhor. Na escola quando consigo desbloquear as minhas dúvidas, os meus receios tudo corre melhor. Partilho uma história vivenciada aquando da realização do cadastro predial no concelho de Oliveira do Hospital, mais concretamente em Aldeia da dez. Estava a fazer um levantamento de um prédio rústico e estavam lá cerca de cinco pessoas a opinar e acabei por não perceber nada do que eles diziam, até que me impus e disse que não estava a perceber nada e apenas saia dali quando percebesse a configuração do prédio(terreno) que estava e medir a área. Acabei uns instantes depois por perceber as estremas do prédio. Nesse período acabaram por acontecer mais situações dessas, no entanto consegui resolver grande parte delas através da minha organização dos meus esquemas em papel. Ainda hoje, e já passaram 10 anos consigo ver através dos inúmeros dossiers que fui construindo a localização dos prédios. Tento idealizar constantemente um modelo de organização que me sinta confortável, no entanto esbarro constantemente na complexidade do ensino de hoje e descuro o mais importante que é dar aulas. Talvez seja essa a solução para muito dos meus problemas. 

Observo o Duarte e vejo que felizmente ele é mais sociável, não tem receio de brincar com outras crianças nos baloiços. Não é preciso dizer-lhe vai. O Duarte é uma criança  muito inocente, ainda não sabe de forma clara o que está certo e errado. Acontece comigo, na definição do risco, saber até onde posso ir. Fizeram-me falta o confronto com regras com limites, fez-me falta conversar mais com os meus pais sobre os meus problemas, as minhas dúvidas. Fez-me faltar falar sobre aquilo que fui alvo na infância/adolescência a professores, amigos mais próximos. 

Tudo o que eu sou hoje é também reflexo do meu passado. Agradeço a quem tem a paciência de conviver comigo diariamente. Posso dizer que apesar de tudo tenho muita sorte.