segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

Pedra após Pedra - A Palavra Diário I (2012-13)- Fernando Alva (III- Humildade e Sensibilidade)


Nas conversas que temos na troca de boleia para a escola falamos de diversas coisas. Em certo dia, referi ao meu colega que caso surgisse repentinamente uma Guerra não estaria preparado para mudar e seria facilmente morto pelas mudanças que estariam a acontecer na sociedade. Eu sinto-me indefeso perante atrocidades que possam surgir num futuro próximo. O meu colega retorquiu dizendo que o ser humano é muito resistente e caso isso acontecesse se adaptaria e tudo faria para enfrentar com dignidade as dificuldades da vida. O assunto ficou por ali, pois nem eu nem ele voltámos a tocar no assunto.

O que vai na cabeça do outro é de facto um grande mistério. Em textos anteriores sobre o livro Pedra Após Pedra- A palavra- Diário I (2012-13) já dei a entender a importância de sermos humildes e sensíveis perante quem está ao nosso lado. Nesta apresentação pretendo expor a importância de nos conhecermos a nós próprios de acordo com o autor Fernando Alva.


Cito p. 33
“Essências
Humildade:
O bornal da viagem;
A simplicidade
De quem sabe
Que não cabe
Dentro das margens,
Muito menos
O estreito pensamento
Que os humanos
Usam como sustento. 

Resta-nos tentar
Restituir cada letra
À forma mais simples
E ficar à espera
De outros toques
Dessa luz
Que nos conduz
Pela escuridão,
Até ao chão." 

É tão importante conhecermos os nossos limites e as nossas fronteiras e a sociedade que habitamos. Nós somos todos tão diferentes. Fernando Alva cita uma passagem muito interessante sobre a diversidade humana na página 41 " Cada Homem é um mundo inteiro e sempre que se encontram dois Homens são também dois mundos diferente que se tocam. Tão diferentes que poucos se compreendem ao ponto de conseguirem reconhecer-se ao espelho.

Apenas uma grande sensibilidade nos poderá, ainda, ajudar a perceber que cada vida transporta em si mesmo o gérmen da sua própria verdade. Nem melhor nem pior .Apenas diferente, de gente para gente. A face visível da nossa potencial eternidade.

Crueldade, bondade humildade tudo nos pertence. Tudo nos articula e anula. Tudo isto, afinal, nos ajuda a compreender o pouco ou nada que podemos, de facto valer.

Humano, demasiado humano- diria Nietzsche..."

Na nossa (minha e do Fernando Alva) profissão de professor lidamos frequentemente com pessoas tão diferentes e por vezes é tão difícil tomarmos as melhores decisões. Eu penso que devemos seguir as nossas convicções mesmo correndo o risco de errar. Fernando Alva refere na página 60 do seu diário a seguinte afirmação muito interessante sobre o reconhecimento e a tomadas de decisões na profissão docente. Cito p.60 "Na escola todos os dias salvamos ou condenamos alguém. Só muito tarde é que infelizmente, o compreendemos. Quase sempre tarde demasiado tarde, para ele e para nós"

Cito p. 61
"Naturezas Construídas
Cada ser humano
É um mundo de vulcões 
Com fugazes explosões 
De profundo desengano." 


Nas escolas do século XXI sentimos que a diferença de modos de vida é cada vez mais latente. A escola tem um papel menos reconhecido, mas cada vez mais importante na sociedade. A escola é  a salvação de largas centenas de crianças que não têm um lar que lhes dê carinho, que naufragam por pela ausência de um ser paternalista que lhes ajude a seguir o melhor caminho. Ninguém pede para nascer.

Cito p. 61
"Anjo da Guarda
Meninos e meninas
Sem defesas do lar
São tenras presas
Condenadas a naufragar.
Mas há sempre alguém
Enviado de mais além
Pronto a fazer sorrir
O que o desconhecimento
Do estudo pelo apontamento
Não pode sentir."

Cada vez que lidamos com o outro devemos ter muito cuidado na forma como o interpelamos sobre certos assuntos que lhe podem ser sensíveis, no entanto tal como Fernando Alva gostava de salientar a importância da troca de experiências no nosso crescimento como seres humanos.

Cito p. 68
Vozes
"Cada língua que falamos
É uma porta aberta
Para outros mundos
Rumo a parte incerta.
No final somos outros,
Apenas mais completos."

A Educação é essência da nossa personalidade e fundamental para nos tornarmos seres humanos mais equilibrados mesmo que por vezes não tenhamos tido a sorte de ter nascido numa família que nos acolhesse  como todos mereciam.


sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020

O prazer de Ensinar


É inevitável deixar de pensar no quão resistente é o ser humano. Por vezes até eu próprio me admiro com a minha capacidade de resistir a tamanhas adversidades. Nestas duas últimas semanas onde as idas ao médico foram constantes e o Duarte insistiu em tornar as nossas noites ainda mais curtas e difíceis, o que deu azo  à necessidade de improvisar estratégias num curto período de tempo, de modo a conseguir aguentar as aulas, quilómetros e muitas reuniões.

A experiência deu-me sem dúvida a capacidade de tornar o difícil mais fácil e conseguir mesmo cansado e doente conseguir cumprir os meus objetivos.

Uma das coisas que mais me doeu ouvir numa reunião intercalar foi um encarregado de educação dizer que os alunos não gostam de Geografia. A minha resposta a esta mãe foi a seguinte: “quem não tenta e se esforça nunca vai saber se realmente gosta de alguma coisa, porque não tentou.”.

Em Geografia no nono ano estou a lecionar uma matéria que até gosto particularmente, os contrastes de desenvolvimento, no entanto está a ser tremendamente difícil arranjar estratégias para cativar os alunos.  Quando estava a preparar aula desta quarta feira sobre Soluções para atenuar os contrastes ao desenvolvimento lembrei-me que quando mostrei a série “Príncipes do Nada na RTP 1” consegui que os alunos estivessem atentos e concentrados a ouvir a Catarina Furtado. Partindo da experiência positiva dessa aula fui à Escola virtual e estudei   um vídeo  sobre a ONU. A minha estratégia consistiu em passar o vídeo, para-lo consecutivamente e fazer questões sobre os principais objetivos da ONU e os países onde esta intervém, transcrevendo tudo no quadro à medida que o vídeo passava.  Foi extremamente desgastante, pois tinha de os colocar sempre a participar a e a intervir na aula mas consegui que os meus objetivos fossem concretizados e que foi  tão bom. Na segunda parte da aula falei dos Objetivos do Milénio e optei por  adotar a mesma estratégia  com outro vídeo da Escola Virtual. Para terminar a aula salientei que os objetivos do Milénio já não estavam em vigor desde 2015 e a ONU tem  atuamente nova metas que são os Objetivos de desenvolvimento sustentável que terminam em 2030.

Ser professor é uma tarefa cada vez mais difícil e exigente, mas o gosto por aquilo que faço faz-me todos os os dias tentar melhorar e aprender mais e melhor com colega, funcionários, alunos, pais etc.

sábado, 8 de fevereiro de 2020

Pedra após Pedra - A Palavra Diário I (2012-13)- Fernando Alva (II-A Família)

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Não é fácil  viver neste mundo, onde temos que lidar com pessoas tão diferentes. Quantas vezes já  ficamos perplexos com aquilo que vimos e ouvimos de alguém. Fernando Alva relata uma história por si vivida no aeroporto da ilha Terceira  nos Açores que retrata a leviandade com que certas pessoas lidam com a vida e com assuntos tão perigosos como o mundo do crime. Cito (p.17) “Abeirou-se de mim, pediu-me informação a respeito da porta de embarque e ,sem mais nem menos confessou-me que era recluso num sistema prisional do continente. Aproveitando a precária, veio passar a semana anterior ao natal junto da família: a mulher e uma menina de três anos.
Logo de rajada como se percebesse o espanto que escorria da minha face, segredou-me que durante anos fora correio de droga. Há dois anos porém, as coisas correram mal e quase matara dois homens. -foi apenas uma questão de sorte as balas não terem acertado nos alvos. -assegurou-me. E eu lá fui balbuciando o que pude. Aliás perante aquela confissão, o que poderia eu dizer que fosse significativo”

No seguimento desta história relatada no primeiro parágrafo vou contar uma história que se passou comigo numa das muitas escolas por onde eu já passei. Eu estava na sala do castigo onde iam os alunos que eram expulsos da sala. Certo dia entra-me na sala  um aluno de forma esbaforida e vociferou algo que eu já não me recordo ao certo o que foi. Mandei-o sentar e acalmar-se e ele disse-me com uma naturalidade que se fosse preciso metia os carros sobre quatro tijolos e nem pensem em meter-se comigo que eu o desfaço-o sem piedade. Fiquei perplexo com a facilidade com que aquela criança de 15 anos falava com aquela revolta sobre a vida e desrespeito com o outro. A forma que eu encontrei para dar a volta à situação foi tocar-lhe na ferida e falar-lhe na família e o que esta achava de ele pensar daquela maneira. O aluno respondeu-me que não queria saber do pai e que apenas tinha algum respeito à mãe  Perguntei-lhe  se ele queria continuar a seguir o caminho da violência em detrimento de poder ter uma profissão e uma vida digna. Aos poucos falei-lhe dos irmãos mais novos que o deveriam ter como referência positiva e não negativa e aos poucos foi retirando a máscara e senti as lágrimas caírem-lhe do rosto. Ser professor de uma criança desta não é fácil, felizmente só tive que conviver com ele na sala do castigo.

Voltando ao livro e a Fernando Alva. Várias vezes no seu livro ele faz referência à importância da família, para si no seu crescimento enquanto ser humano e a sua importância para superar os diversos obstáculos que a vida lhe coloca. Ir a casa no período de férias é uma terapia que Fernando Alva não dispensava.. Após um período de férias Natalícias escreve um excerto um muito interessante. Cito (p 18) “De regresso à ilha Terceira, com os pés ainda presos às raízes nativas. O que trago de mais significativo? Os diálogos com os meus pais, à  volta da mesa, junto à magia da salamandra, num dos recantos da sala onde esteve um dia amortalhada a minha avó materna. (…) O diálogo com uma senhora de 85 anos, na Bobadela em Oliveira do Hospital. Mas…. acima de tudo, o regresso da família, o sorriso escondido dos meus pais e a tranquilidade da minha terra de sempre que trago camuflada nas profundezas da minha alma (…).
Num excerto mais à frente o autor aborda a chegada à ilha após as férias da Páscoa, onde este se refere mais a importância do período da pausa escolar.
Cito (p. 38) “ Primeiro dia de aulas do terceiro período. Regresso à selva, depois de quase duas semanas na segurança que só a casa materna me pode dar. Existem determinados ambientes onde nos tornamos imunes a quase tudo, até mesmo à vontade de trabalhar! Que santuário….”
Cito (p. 37)
Pirâmide invertida
O chão em que nascemos
Dita onde chegamos.
Poucos são
Os que escapam
À terrível condição
Onde se enraízam.
Afinal, quase tudo se resume
A laços”

Conhecermo-nos a nós próprios é fundamental para crescemos de forma segura. A família deve ser o elo de ligação ao passado e a nossa segurança para nos desenvolvermos enquanto cidadãos no futuro.

Cito (p.39)
“Cicatrizes
As memórias que herdamos,
Onde também nos agarramos
(Quem disse que o mar não tem cabelos?).
Que o os pais deixam os filhos.
Memórias, imagens que vagueiam
Na fossa mais profunda
E iluminam,
Em cada esquina da vida.

Mal sabemos
O que escondemos
Para lá da gestação
De multidão
Onde nos escondemos
E procuramos.
Ah, tanto devemos
E mal-agradecemos…
Quanto perdemos as estrelas
Todas as luzes se apagam.
Depois, apenas permanecem memórias
Cada vez mais fragmentárias."

Cito p. 66
"Apagadores
Sempre que tentamos silenciar
O passado
Acabamos por silenciar
O futuro do nosso lado"

Ter uma família e um passado seguro é algo que infelizmente muitas crianças e adultos não têm, daí há uma pequena explicação para muitos dos seus atos.
Como já indiquei na primeira parte do meu texto informativo sobre esta obra, Fernando Alva é professor de Educação Especial e fala disso de uma forma positiva salientando a importância para a sua formação enquanto pessoa.Cito p. 44" Saltitar de disciplina em disciplina, de matéria em matéria em matéria, a procurar apoiar alunos com graves dificuldades de aprendizagem nos mais variados domínios tem-me ajudado bastante a identificar as principais causas que motivam as elevadas taxas de insucesso académico das nossas crianças e jovens. Todos os candidatos a políticos deveriam ter a humildade de passar pelas salas de aula, antes de abrirem a boca para dizer o que quer que fosse a respeito da educação.Aí sim compreenderiam melhor o extraordinário e ingrato trabalho desenvolvido pela maioria dos professores portugueses."

A família é de facto algo essencial para uma criança crescer saudável quer física e mentalmente. Vou redigir um poema escrito por Fernando Alva onde ele refere um menino que infelizmente não teve a sorte de ter um seio familiar.

Cito p. 26
"Aparências
Menino de  unhas sujas
Sem ninho
De carinho onde possas adormecer
Depois de ler
O brilho de imaginar
O sabor do lar.
Olha-me por dentro
Neste último encontro
E liberta o sorriso
Gostoso
Que um dia nasceu
Quando o meu vazio
De silêncio
Te conheceu.
O resto já não interessa,
Mas ele permanecerá.
Até sempre, meu menino"

Para concluir esta exposição sobre a família vou narrar uma história descrita pelo autor onde este expressa o contacto e o diálogo que manteve com crianças na ilha Terceira.
Cito p. 78 e 79 "Um dos meninos que o destino parece amaldiçoado segredou-me que gostava de ir à Igreja , depois da escola. Perguntei-lhe se rezava. Respondeu-me que não, que nem sequer pensava. E eu voltei à carga:
- Então...e depois?
- Depois sinto uma mão na cabeça.
Vim para casa a pensar que um menino de 11 anos nunca deveria conhecer o sabor do abandono .

Outro jovem, com cerca de 13 anos, ouviu-me declamar, com inenarrável  entusiasmo, O menino de sua mãe, de Fernando Pessoa. Depois fomos explorando estrofe a estrofe, num crescendo dramático de dúvidas e inquietação. Quase no fim perguntou-me:
- A mãe queria que o menino voltasse?
- Pois queria.
Avançamos na leitura e na última estrofe:
- Mas o menino já era grande?
- Para as mães, os filhos são sempre pequeninos- silêncio
- Mas o menino nunca voltou, pois não?
- Pois não.
E eu vi, vi uma lágrima cair-lhe lentamente do rosto. Os relatórios dizem tratar-se de um menino com Perturbação do Expectro do Autismo. E sinceramente, neste momento, isto pouco ou nada interessa.

Poesia, que poderosa chave para abrir corações. Até mesmo daqueles de quem tantas vezes estupidamente se diz que não têm emoções e são frios como pedras."

E com esta história termino o tema família ou a falta dela, tão bem narrado neste livro.


quinta-feira, 6 de fevereiro de 2020

Pedra após Pedra - A Palavra Diário I (2012-13)- Fernando Alva (I- Educação Especial)


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No final de Fevereiro ou inicio de Março irei fazer a apresentação do 2º livro do diário Pedra após pedra do  meu grande amigo Renato Nunes ou Fernando Alva como ele se intitulou neste diário transcrito nos Açores.

Fernando Alva, apesar de nascido em França, foi muito novo para Vila Franca da Beira (Oliveira do Hospital), considerando a Beira alta a suas raízes.  O heterónimo é a sua homenagem ao rio alva, um rio que vai desaguar num dos principais rios genuinamente portugueses, o rio mondego e a diversos Fernandos que o marcaram o autor ao longo da sua ainda curta vida. Fernando Valle ,um histórico fundador do partido socialista, Fernando Pessoa, o poeta português que ficará para a eternidade e o jovem Fernando Eugénio abruptamente ceifado pela morte aos 13 anos.

Fernando Alva é professor de História que enveredou pelo Educação Especial como forma de ingressar numa carreira e profissão muito exigente mas que o preenche, alimenta e ajuda-o e enriquecer a sua memória. O primeiro volume do diário que já está disponível intitula-se  de “Pedra após pedra”, recua aos anos 2012 e 13, onde o autor esteve  a lecionar nos Açores, mais concretamente na ilha Terceira.
Fernando Alva intitula-se poeta da solidão e do silêncio. No isolamento e insularidade do arquipélago o professor encontrou nas palavras e nas letras, um refugio, um sinal de sobrevivência numa sociedade e num meio muito peculiar.

O próprio nome do livro leva-nos a pensar nas inúmeras pedras que passam pelo nosso caminho e que temos que as ultrapassar, tantas vezes com imensas dificuldades.  Parafraseando o autor (p.7)“ Pedras afiadas que magoam por vezes, fazem mesmo sangrar. Mas que ninguém se iluda pois é sobre as pedras afiadas que se aprende a ver um pouco melhor, nessa longa caminhada trágica e irónica que é a vida”.

Quando lia o livro lembra-me das conversas que tivemos os dois, onde aprendemos  imenso um com o outro.  Na profissão de professor devido ao contacto que mantemos com pessoas tão diferentes crescemos e aprendemos tanto com os alunos, colegas, pais ou simples moradores da localidade onde estamos. Aquando da leitura do livro foi impossível desligar-me da minha experiência pessoal onde partilho a mesma profissão. Nos dias de hoje com a quantidade de tarefas a que estamos sujeitos  temos obrigatoriamente de seguir o nosso caminho e a acreditar mesmo naquilo que pensamos, caso contrário somos “engolidos” de forma voraz pela sociedade. Fernando Alva salienta a importância de pensarmos pela nossa cabeça. Cito (p.8) “Que o leitor se indigne, conteste ou condescenda. Mas que ouse sempre pensar pela sua própria cabeça e se liberte das mais potentes amarras que podem existir, os medos que nós próprios alimentamos com as vísceras da ignorância e da cobardia. Tudo o mais diz respeito ao autor destas palavras seja ele quem for”.

Não sendo professor de Educação Especial não consigo perceber na totalidade as dificuldades que estes alunos sentem. Nas últimas décadas houve um maior reconhecimento sobre a importância de reconhecer e integrar estas crianças na sociedade. Sobre isto gostava de passar uma conversa  tida numa reunião, onde uma professora de educação especial quando confrontada com as inação de colegas perante um aluno com  muitas dificuldades de aprendizagem, esta disse mais ou menos assim” Se ele fosse vosso filho gostavam que ele fosse tratado assim, ele é um ser humano que teve a infelicidade de nascer diferente”.  Esta frase fez-me pensar. Nos dias de hoje gerir uma turma com alunos sem dificuldades de aprendizagem por si só já não é uma tarefa fácil e quando é integrado um aluno diferente que mal sabe ler, questiono o papel que nós podemos ter para o integrar e o fazê-lo crescer como ser humano.  Sem dúvida por vezes sentimos que não temos formação para fazer face à crescente complexidade da profissão.

Voltando ao “Pedra sobre pedra” de Fernando Alva queria realçar o trabalho que tem sido feito nas escolas perante as crianças com dificuldades de aprendizagem, no entanto ainda há um longo caminho a percorrer. Numa das suas idas à biblioteca local de Fernando Alva dá entender as dificuldades que a sociedade tem para integrar estes seres humanos. Cito (p.15) “Na Biblioteca local (Praia da Vitória), pode ler-se na estante : 376. Ensino Especial , Analfabetos e deficientes. Rastos ideológicos de um passado que pensamos distante, mas que, na realidade continua bem dentro de nós.”  

Aprendemos tanto com as crianças mesmo diferentes ou com menos capacidades. O ensino tem que mudar em duas vertentes: perceber melhor as motivações das crianças e as crianças perceberem melhor a importância da escola. Cito uma passagem do livro onde o autor se refere a uma menina dita problemática pela sociedade (p. 22)  “Uma menina de 11 anos dessas consideradas pelo sistema como terríveis -, a frequentar o 7º ano vem à frente da sala apresentar o mais conhecido livro de Antoine Saint – Exupéry e deixa-me a bocas aberta com apenas duas frases : Às vezes nós vivemos num monte de palavras e neste eu senti um principio, um meio e um fim, uma história e isso é tão raro”; Nós precisamos de várias mensagens para viver. Eis aqui condensado o sentido da literatura trazido por uma das piores alunas da turma  (assim diz o sistema)
E sinto vergonha de mim”.

Dado a complexidade e a quantidade de temas que podemos aprender e trabalhar neste livro. Eu  deixo-vos aqui a minha primeira abordagem que espero que tenham a curiosidade de ler.