sábado, 30 de janeiro de 2021

O passaporte da minha avó Autor: Renato Nunes

Tenho à minha frente o passaporte da minha avó materna, nascida em 1911, ano em que foi publicada a lei da separação das Igrejas do Estado. O referido passaporte, emitido na década de 30 do século passado, invoca as viagens marítimas realizadas entre Portugal e o Brasil (Santos), contendo os necessários carimbos da polícia política do Estado Novo (à época designada Polícia de Vigilância e Defesa do Estado). O regresso definitivo ao território nacional ocorreu entre os derradeiros dias de Agosto e o início de Setembro de 1939. Eis, por conseguinte, a minha avó no meio do Atlântico, provavelmente temerosa com a passagem do Equador, enquanto deflagrava a II Guerra Mundial (1 de Setembro).

Chegava, assim, ao fim uma aventura iniciada uns anos antes, em circunstâncias pouco ou nada favoráveis, pois o crash da bolsa de Nova Iorque, em 1929, desencadeara uma das maiores crises financeiras, políticas e sociais, com ramificações a nível mundial. O repatriamento para Portugal, enquanto “indigente” (como figura no passaporte), comprova o que acabei de dizer. Alguns meses depois nasceria a minha mãe, filha de mãe solteira e de pai incógnito, numa remota aldeia do interior beirão. E penso que não serão necessárias mais palavras para o leitor imaginar o profundo estigma que à época recaiu sobre essa mulher recém-chegada do Brasil, de olhos castanhos, com 1,51m de altura e, como era comum na época, sem nunca ter desfrutado do privilégio de frequentar a escola para aprender a ler e a escrever…

Enquanto jovem, mal tive a oportunidade de conhecer a minha avó materna, mas hoje, já na casa dos 40, penso muitas vezes nesta destemida mulher e no drama da sua vida, passada a tratar das pesadas lides domésticas e agrícolas, próprias ou alheias, para à noite regressar a um casebre de granito, sem água, sem luz ou gás, onde o vento e a chuva faziam sentir a sua presença. Mas sempre com os velhos baús de madeira, vindos do Brasil, presentes no espaço nobre da sala improvisada... 

À medida que os anos transcorrem, o estudo do indivíduo e das suas circunstâncias insiste em fascinar-me cada vez mais. O exercício biográfico proporciona-nos, desde logo, um “encontro” com o ser humano, nas suas várias facetas e realidades quotidianas, quer enquanto personalidade pública ou simples cidadão anónimo. Quando se estuda um Homem, o local e o global entrelaçam-se de um modo tão inextricável, que é impossível compreender um sem mobilizar o outro. O exemplo concreto da minha avó e das circunstâncias dramáticas nas quais o mundo estava mergulhado quando ela procurou viver a aventura do Brasil poderão ajudar o leitor a compreender melhor o que pretendo afirmar. Outro exemplo concreto poderia passar pela participação dos portugueses na I Guerra Mundial: imaginar um dos meus conterrâneos beirões, “serranos”, nas trincheiras da Flandres, entre 1917 e 1918, é um pouco como se me fosse permitido contemplar o momento em que a história do indivíduo e a história do mundo deram as mãos (a obra de Isabel Pestana Marques — Das Trincheiras com saudade — é a este respeito uma sugestão de leitura incontornável).

É nesta mesma linha que gostaria de partilhar o entusiasmo que vivi recentemente, enquanto lia sofregamente um livro intitulado História Global de Portugal, dirigido por Carlos Fiolhais, José Eduardo Franco e José Pedro Paiva. Trata-se de um conjunto de 93 textos produzidos por cerca de 80 autores, integrados em cinco partes aglutinadoras: Pré e Proto-História, Antiguidade, Idade Média, Época Moderna e Época Contemporânea.

Um dos aspectos surpreendentes da obra, com um total de 660 páginas, reside, desde logo, na sua estrutura coerente e rara limpidez textual. Os textos individuais, com cerca de seis páginas, podem ser lidos nos momentos mais banais do quotidiano, trazendo-nos um conjunto de sínteses, que colocam em causa vários mitos que continuam erradamente a ser repetidos até à exaustão. Apenas alguns exemplos: a associação simplista dos Montes Hermínios à Serra da Estrela, bem como da Lusitânia ao actual território português ou até mesmo a pouco sustentada associação de Fernão Magalhães a um suposto projecto de circum-navegação do Mundo, quando, de acordo com as fontes disponíveis, o seu objectivo passou isso sim por atingir as Molucas (ou ilhas de “Maluco”), na Indonésia. Poderia também destacar teses particularmente interessantes, como sejam as sucessivas movimentações humanas, já desde a Pré-História, a emissão de gás metano antes da Revolução Industrial (século XVIII), o entrelaçamento entre o mundo atlântico e o mundo mediterrânico, pelo menos desde a Idade do Bronze (III milénio a.C.), bem como alguns apontamentos interessantes a respeito da presença dos Viquingues no território que actualmente integra Portugal ou ainda um actual exercício de síntese a respeito da peste negra, no século XIV, que teria provocado a morte de aproximadamente 50 milhões de pessoas, das cerca de 80 milhões que à época viveriam na “Europa” (p. 272), bem como uma interessante entrada sobre o estudo da cultura do arroz em Portugal (pp. 347-351).

Este esforço, ainda pouco comum mesmo na comunidade científica nacional, de congregar um número elevado de investigadores à volta de um projecto comum, procurando entrelaçar o local e o global afigura-se-me meritório, sendo que a obra em causa passa a constituir uma ferramenta de trabalho quase obrigatória, quer na mesa de outros investigadores, professores ou simples curiosos pela compreensão do mundo em que vivem.

A reflexão que agora procuro desenvolver ajuda-me também a recordar um antigo professor universitário chamado Saul António Gomes, um historiador especializado na Época Medieval, ao qual, se bem me lembro, ouvi repetidamente — durante as aulas de Paleografia e Diplomática — sustentar que era forçoso ultrapassar a velha dicotomia entre o local e o nacional/mundial, pois os designados “estudos locais” ainda eram frequentemente percepcionados de um modo particularmente pejorativo. Não posso assegurar que eram exactamente aquelas as palavras utilizadas pelo aludido docente, mas aquela ideia continua, cerca de duas décadas depois, bem presente no meu espírito e esta também é, por conseguinte, uma das melhores homenagens, que, segundo creio, posso continuar a prestar-lhe.

Entre os aspectos mais discutíveis da obra, talvez seja importante destacar os seguintes: associação, frequentemente forçada, do tema em estudo a um suposto e quase obsessivo carácter global, o que, como teve oportunidade de assinalar Diogo Rama Curto numa crítica particularmente incisiva (p. 401), se traduziu, por vezes, em exercícios que roçam o anacronismo; uma perspectiva, porventura, demasiado decalcada da interpretação eclesiástica do fenómeno das “Aparições” de Fátima (1917), apresentada pelo historiador do Departamento de Estudos do Santuário de Fátima, Marco Daniel Duarte (pp. 573-578), parecendo ignorar, por exemplo, a transformação da própria mensagem apresentada pela Igreja Católica (os designados “segredos”) ao longo do século XX (ver, a este respeito, os estudos do historiador Luís Filipe Torgal ou numa perspectiva mais teológica as obras do proscrito padre Mário de Oliveira, bem como os “inflamados” textos de Tomás da Fonseca). Destaque-se, ainda, a quase omissão dos Açores (abordados superficialmente), que, à semelhança do que sucedeu com a Madeira, bem mereciam um texto individualizado; a integração do Estado Novo, num período situado logo a partir de 1928 (p. 359), o que, em certo sentido, escamoteia as especificidades da Ditadura Militar/Nacional (1926-1932); a ausência de notas de rodapé, o que se por um lado permite uma leitura mais fluida dos textos, por outro lado impede a confirmação dos elementos mencionados e, neste sentido, dificulta o trabalho de outros investigadores que pretendam debruçar-se sobre o tema.

Estes e outros aspectos da obra, que mereciam ser discutidos e aprofundados, não obscurecem, no entanto, o seu inestimável valor e pertinência, justificando-se plenamente a sua leitura. Afinal, os tempos que vivemos revelam-se cada vez mais incertos e com perigosas e assustadoras similitudes com as décadas de 20 e 30 do século passado, no decurso das quais milhões de pessoas ansiaram por um salvador, que destruísse o sistema e voltasse a construir, do vazio, um mundo perfeito. O resultado monstruoso desse passado já muitos de nós o conhecem, mas qual será o resultado deste presente que agora vivemos? Qual será o desfecho desta tendência assustadora que leva a que, em várias freguesias portuguesas, a extrema-direita se torne numa das forças políticas mais votadas?

Os argumentos, os não-argumentos, a hipocrisia e a loucura dos novos potenciais ditadores que por aí pululam, alimentados pelos dramas que estamos a viver, apenas poderão ser combatidos com mais conhecimento científico e políticas inclusivas. Eu não conheço outra ferramenta que possa ajudar-nos tanto nesse combate como a História. É também por isso que, apesar de as contingências da vida me terem forçado a procurar a sobrevivência para além das suas fronteiras profissionais, continuo frequentemente a agradecer o privilégio de poder estudá-la. A agradecer a todos aqueles que me ajudaram a amá-la, em especial aos professores com os quais tive a sorte de cruzar-me. É também graças a essa ciência-narrativa que pude e posso diariamente compreender melhor aqueles que me rodeiam e rodearam, como a minha querida e saudosa avó materna, que um dia rumou para o sonho do Brasil, em busca de uma vida melhor, mas poucos anos depois foi forçada, também pelo terrível poder da crise global, a regressar ao país natal, no navio “Highland Princess” e a enfrentar uma sociedade ultraconservadora e machista, onde a mãe solteira era frequentemente alvo da chacota e da exclusão social…

Mais do que através de leis e mais papéis, a inclusão constrói-se com conhecimento e sabedoria, algo que dificilmente se poderá separar da História. Ignorar isto é continuar a alimentar os extremismos. E quem alimenta monstros, acaba por ser devorado por eles — é apenas uma questão de tempo…       

Referências bibliográficas: Carlos Fiolhais, José Eduardo Franco e José Pedro Paiva (direcção) — História Global de Portugal, 1.ª edição, Lisboa, Temas e Debates, 2020.

 

Renato Nunes (renato80rd8918@gmail.com)

quinta-feira, 28 de janeiro de 2021

Memórias da década de noventa

A infância e adolescência, são fases da minha vida que evito falar.

Quando algum colega ou amigo falava das aventuras e desventuras desta fase da sua vida eu imiscuía-me de dizer o que quer que fosse. Lembro-me que fui sempre muito reservado e metido comigo mesmo. Nas saídas sociais recordo-me que tinha receio de falar e emitir a minha opinião, pois achava que não tinha relevância. O nervosismo o desconforto quando estava em grupo eram latentes.

As minha memórias são muito ténues e refletem momentos bons e menos bons que passo a narrar de forma salteada:

No primeiro ciclo do ensino básico recordo-me do meu primeiro dia de aulas, ainda na antiga escola primária, atual escola Profissional de Oliveira do Hospital (Eptoliva) no final da década de 80. Como entrei um pouco mais tarde lembro-me que fui recebido de forma calorosa pelos meus colegas de turma.

As minhas professoras do 1º ciclo ainda faziam parte da velha guarda de professores, onde o castigo por errar tinha consequências diferentes das atuais. Cito duas situações que me recordo: a primeira prendia-se com a penalização aquando dos erros nos ditados, no qual erámos castigados com uma reguada de madeira por cada erro que dessemos, lembro-me que quando tentava tirar era pior pois batia-me no osso e eram dores horríveis; a segunda história aconteceu no final do quarto ano, que em consequência de uma ação que eu fiz (sinceramente não me recordo) a professora castigou-me colocando-me de joelhos em frente ao quadro. Tudo castigos que já não se usam há mais de duas décadas. A minha professora do 1º ano reformou-se no final desse ano letivo e a professora que a seguiu até ao final do meu primeiro ciclo reformou-se uns anos depois da conclusão do meu quarto ano de escolaridade.

No primeiro ciclo estive em duas escolas diferentes: nos dois primeiros anos estive na escola antiga  e nos dois anos seguintes fiz a transição para a nova escola e atual escola primária de Oliveira do Hospital.  No início da década de 90 o momentos mais marcantes foi o encerramento da escola por causa da neve. Foi a primeira e única vez que isso aconteceu. Na altura a ainda vila de Oliveira do Hospital ficou coberta de neve. O meu desalento veio quando cheguei a casa e soube que tinha de ir para Coimbra com os meus pais e não podia brincar com a neve ao outro dia salvo erro uma sexta feira do mês de fevereiro do inicio da década de 90.

As mudanças de ciclo foram para mim sempre uma grande tormenta, principalmente do 1º para o 2º ciclo e do 3º ciclo para o secundário.

Em consequência de naquele tempo o primeiro ciclo ser composto apenas por um professor a adaptação às mudanças para uma escola maior onde passei a ter quase 10 professores e várias salas de aula foi dura e difícil durante as primeiras semanas.

Nos tempos de escola, tal como agora nunca fui um grande jogador de futebol ao contrário do meu pai.  Lembro-me de dois torneios inter-turmas onde sobressaí, daí estar a falar disso, pois por norma era uma peça acessória e não saía do banco: o primeiro momento que quero destacar estava no segundo ou terceiro ciclo e recordo-me que na altura me colocaram a jogar e marquei um golo a alguns metros da baliza e na altura todos vieram a correr na minha direção, abraçaram-me deixando-me no meio de um conjunto de braços e pernas. Sentimentos estranhos para mim na altura e se calhar ainda hoje. O segundo torneio fora do normal, não me recordo ao certo se foi no terceiro ciclo ou secundário coincidiu com a ausência dos melhores jogadores e eu acabei por ter uma preponderância fora do normal, ganhámos e eu marquei dois golos o que para mim era um feito.. Acabámos por ganhar esses torneio e ainda tenho a medalha em casa dos meus pais. 

Outra mudança que eu me ressenti  muito foi a passagem do ensino básico para o secundário. A mudança de escola assim como a tipologia de ensino teve consequências nas notas que foram mais baixas no primeiro período. 

O meu ensino secundário coincidiu com a introdução dos telemóveis e da Informática na educação em Portugal. Lembro-me que nas aulas de Introdução às tecnologias de informação (ITI) se trabalhava com o Windows 95 onde ainda se dava umas pinceladas de MS DOS. Recordo-me de um colega que partilhava comigo o computador que já tinha telemóvel e sempre que recebia uma chamada ou uma mensagem sentiam-se as vibrações no ecrã do computador.

Nunca fui de grandes saídas à noite, restringia-me muito ao seio familiar que era onde me sentia mais confortável. Recordo-me de brincadeiras que tive com dois amigos que na altura eram os meus dois melhores amigos, o Pedro e o Ricardo. Hoje devido a  termos percorrido caminhos diferentes falamos de vez em quando por telefone. As brincadeiras de crianças hoje são reconhecidas como infantis ou adequados à época que vivíamos.

Uma das brincadeiras menos felizes foi lembrarmo-nos de combinarmos um encontro em minha casa à noite para darmos uma volta de bicicleta. Eles chegaram lá cada um com o seu foco e prontos para a aventura. A casa dos meus pais fica a cerca de 3 quilómetros de Oliveira do Hospital e na altura não havia tanta iluminação como há hoje e recordo-me muito bem que pouco víamos à frente da bicicleta mas lá fomos. Fomos até Oliveira do Hospital, na altura ainda não tínhamos o hábito dos bares, calcorreamos algumas ruas e estradas, levámos uma buzinadelas de carros que nos ultrapassavam e depois cada um foi para sua casa. Nesta fase da minha vida foi a coisa mais estapafúrdia que me recordo de ter feito, felizmente ninguém se aleijou.

Naquela altura não havia os mails nem telemóveis e o contacto com as raparigas era feito através de cartas que lhe chegavam através de amigos ou familiares. Eles faziam-no muito, enquanto eu não tinha tanto esse hábito. Lembro-me que fiz um bilhete para uma rapariga e não tive grande sucesso. 

Nas férias reuníamo-nos em minha casa para jogar à bola num terreno por trás da garagem onde o meu pai tinha apenas mato. Nós limpámos aquele espaço e improvisámos um campo de futebol com pedras e acho que aproveitámos as árvores que lá gereciam para servir de postes.  Passávamos ali tardes os três quando não convidámos mais 1 ou 2 para fazerem parte das nossas conversas e das correrias atrás de uma bola.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2021

Memórias da minha vida profissional

Ser professor com gosto é algo fantástico!  Eu dedico-me imenso àquilo que faço quando sinto que sou útil e contribuiu para o meu crescimento profissional. Sabe bem passado vários anos os alunos não terem vergonha de virem ter connosco e cumprimentarem-nos com respeito e admiração.

Lembro-me quando estive em Sabóia- Odemira (2009/10) a minha colega de História com uma simpatia e simplicidade singulares me disse "ser professor é duro mas quando as coisas correm bem é tão bom".  Apesar de já não me lembrar  do nome dela ainda recordo-me das suas feições e da paixão que ela tinha em ser professora. Tinha imenso respeito por ela e adorei trabalhar com ela.

A minha fase inicial de carreira foi muito difícil, definitivamente não estava preparado para desempenhar tais funções. 

Lembro-me de dois episódios positivos que aconteceram no início da minha carreira docente:

O primeiro aconteceu em Rio Maior (2010/11) após 2 anos a dar aulas a alunos do 3º ciclo e secundário que não ligavam nenhuma à minhas aulas. Nesse ano em Rio maior dei aulas à noite a turmas de adultos e  recordo-me que numa aula que me correu particularmente bem ter dito  aos formandos no final. "obrigado". Sabe bem quando estão atentamente a olhar para nós a ouvir-nos com gosto. Não estava habituado a isso e como nunca tinha tido essa sensação a expressão veio do coração e foi espontânea.

O segundo episódio aconteceu no início da segunda década do século XXI onde estive alguns meses desempregado e as aulas como professor de ténis mantiveram a minha cabeça ocupada. Foi uma experiência muito boa pois dessa forma senti que estava mais preparado para entrar no mercado de trabalho. Na altura Portugal vivia uma situação de crise económica e havia muito desemprego docente. Concorri a um colégio sem esperança de lá ficar pois nessa altura entrar num colégio só mesmo com contactos terceiros. Após a entrevista no regresso a casa lembro-me perfeitamente que parei em Coimbra para comer qualquer coisa quando me ligaram a dizer que tinha sido selecionado. Lembro-me que fiquei muito contente e recordo-me perfeitamente, quando após me terem dado a notícia inesperada eu ter dito prolongadamente obrigaaaadoooo.

Aquele mês que passei no Colégio Rainha Dona Leonor nas Caldas da Rainha no ano letivo 2011/12 foi muito duro, trabalhei muito e  ainda hoje me recordo do dia da apresentação e o principalmente do dia da despedida  onde a diretora, uma engenheira com formação na área da gestão me disse " já vai embora", "nota-se que gosta de ensinar". São expressões que nos enchem o ego e vamos buscar quando estamos menos bem.

A partir daí consegui contactos com colégio privados onde andei até final de 2012, e devido à má experiência acabei por deixar de vez o ensino durante um longo período de tempo.

Entre 2013 e 2017 estive sempre fora do ensino. 

Neste período distante das salas de aula tive várias profissões. Aprendi e conheci gente muito interessante em todas elas, no entanto houve uma que me marcou particularmente, técnico de campo no projeto piloto do cadastro predial de Oliveira do Hospital. Cresci imenso profissionalmente nesse período  entre 2014 e 2015.

Nesta altura os empregos que exercia eram precários:  estagiário na Câmara Municipal de Oliveira do Hospital, carteiro, comercial da Vodafone, ou guia turístico na freguesia da Bobadela.  Penso que não me esqueci de nenhuma função realizada. De todas as profissões descrita neste parágrafo a que mais gostei foi a de guia turístico, não me revendo a trabalhar em qualquer uma das outras.

O nascimento do meu filho em Janeiro de 2017 teve um peso fundamental no meu reerguer profissional e regresso de uma forma mais segura à vertente educativa.

Curiosamente no dia em que ele fez uma ano, a 29 de janeiro de 2018, fui-me apresentar na escola secundária do Fundão. O regresso ao ativo não foi fácil no entanto soube muito bem  no final aperceber-me que tinha conseguido ultrapassar o primeiro obstáculo onde foi muito importante a ajuda da Cecília 

Daí para a frente os obstáculos prosseguiram e nos dois ano letivos seguintes lecionei em duas escolas em simultâneo. Em 2018/19 (Manteigas e Pampilhosa da Serra) e 2019/20 (Pampilhosa da Serra e Tabuaço). A vontade de ir a casa  e poder ver o meu filho diariamente suplantou a dureza que as centenas de quilómetros ofereciam. No ano letivo 2019/20, especialmente duro. guardo a simpatia das escolas por onde passei e nunca me irei esquecer daquele mail que a escola de Tabuaço me enviou quando fui colocado em Grândola, agradecendo o meu trabalho e desejando-me sorte para o desafio que iria ter no ano letivo 2020/21. São gestos simples que eu dou um enorme valor.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

Vírus made in USA- Autor Antenor Santos

 A invasão do Capitólio nos Estados Unidos da América não ameaça apenas a democracia americana. Tal como a Covid 19, também os acontecimentos da semana passada, na casa de uma das supostas mais consolidadas democracias do mundo, pode trazer consequências a nível global, com contágios difíceis de conter em algumas repúblicas inspiradas na Constituição Americana de 1787. Em muitos países, que conviveram com a falta de liberdade e que a recuperaram à custa de tantos sacrifícios, repressões e mortes provocadas por guerras impiedosas, já poucos se lembram do passado bem recente. 

Com acenos de promessas vãs, já por demais conhecidas, mais “Trumps” espreitam novas oportunidades. Os seus seguidores, que, impunemente, vêm já mostrando há algumas décadas os seus ódios mais ou menos contidos, têm agora mais motivos para mostrar as suas garras. A tentativa torpe de anulação da decisão legítima da maioria do povo americano foi um mau exemplo, que poderá contagiar muitos cidadãos ingénuos espalhados por todo o mundo. E dentro do próprio país é também muito fácil de acontecer. 

A civilização americana tem dado bons exemplos no cumprimento dos princípios consagrados na sua constituição. Porém, nas relações internacionais, frequentemente parece comportar-se com demasiada sobranceria e até mesmo arrogância, querendo impor a sua vontade à custa da ostentação do seu poder económico e, em alguns casos, apoiado na força das suas armas. O seu povo é globalmente generoso, mas a ignorância tem alastrado a um ritmo vertiginoso. 

Se os protagonistas desse acontecimento surreal, passado há dias na casa da democracia americana, não forem exemplarmente vacinados (leia-se punidos), o vírus, agora made in USA, poderá causar muitos estragos intramuros e nas frágeis repúblicas onde muitos lobos estão travestidos de inocentes cordeirinhos. 

Para evitar a propagação dessa peçonha, cabe aos norte-americanos contê-la e erradicá-la dentro das suas fronteiras, sob pena de se deixarem desacreditar ainda mais, no que respeita à tentativa de impor a nível global a paz que não conseguiram fazer triunfar no seu próprio país. 

Não quero ser pessimista e muito menos fazer futurologia, mas temo que, se os cidadãos dos Estados Unidos da América, país que admiro bastante, não conseguirem reconciliar-se rapidamente, e curarem as suas feridas sem as deixar infetar e as deixarem propagar, este império que já dominou o mundo, possa ter os dias contados.

Quem conhece o passado histórico sabe muito bem que não há impérios eternos

                                                                                                                                Antenor Santos

sábado, 9 de janeiro de 2021

Confinamento- a minha opinião

Vivemos dias muito difíceis. 

Pela primeira vez desde o início da pandemia apercebo-me de dezenas de pessoas infetadas e algumas  internadas no seio da minha família e amigos mais próximos. Estamos todos assustados com a evolução desta doença onde muitos hospitais já atingiram o seu limite. Os profissionais de saúde são uns verdadeiros heróis que devem recompensados financeiramente por tudo o que têm feito. O meu Obrigado a todos!

Para mim o que mais me tranquiliza é saber que tenho um Governo e um Presidente da República que assegura o funcionamento de uma democracia estável. Quando vejo pessoas a reclamar os seus direitos, para mim é algo positivo pois é sinal que as pessoas têm esperança e sabem que o governo apesar de não lhe poder dar resposta as ouve e tenta dentro das suas possibilidades arranjar-lhes uma solução.

Nas redes sociais sucedem-se comentários que afirmam a necessidade de voltar ao ensino à distância. Eu próprio já assenti com um "gosto" ao fecho dos estabelecimentos de ensino e ao retorno ao ensino à distância.

Bem, tendo a experiência do que sucedeu no confinamento de março apercebo-me que o fecho total das escolas é a solução mais fácil mas não é a melhor solução. 

Na minha opinião o ensino universitário e secundário devia encerrar totalmente ou grande parte da semana. Os professores  deverão ir apenas um a dois dias à escola  para tirar dúvidas. Neste tipo de ensino os alunos já são autónomos e os pais já terão liberdade para trabalhar quer presencialmente quer em teletrabalho..

Nos restantes níveis de ensino é menos produtivo o ensino à distância. Neste caso faria mais sentido um ensino presencial com uma redução da carga horária dos alunos, a redução  dos programas e optar-se por métodos de ensino onde o teste não seja  o centro da avaliação. Esta fase pode ser aproveitada para valorizar o tempo em sala de aula onde  o professor deixe de ter tanta pressão no cumprimento dos programas. Em tempos de pandemia o primeiro, segundo e terceiro ciclos poderiam ter aulas apenas  de manhã ou de tarde, ficando com o restante tempo livre. Caso os pais não os possam ir buscar poder-se-ia optar por ATL's.

O professor com menos tempo letivo aproveitaria com certeza o tempo livre de modo a prepara aulas com mais qualidade, rentabilizando melhor o tempo. O trabalho do professor em sala de aula é apenas uma pequena percentagem do total. 

 Na minha opinião os exames nacionais deveriam existir apenas no ensino secundário e extintos nos restantes níveis de ensino.

Na terça feira (12 de janeiro) após a reunião com o Infarmed o governo decidirá sobre o modo como será feito o confinamento. Desejo que sejam tomadas decisões conscientes para a conclusão do segundo e terceiros períodos e assim  como toda a gente desejo que a partir do próximo ano letivo já consigamos trabalhar de uma forma mais próxima do normal.

Opinar num blogue é muito fácil, pois as minhas responsabilidade são apenas como professor e pai. Admiro a coragem de quem tem de tomar decisões numa altura tão difícil.

domingo, 3 de janeiro de 2021

Bom ano aos leitores do blogue

Tencionava parar de escrever durante um tempo. No entanto há algo mais forte que eu que me pede para desenlaçar umas breves frases neste início de 2021.

Amanhã vou começar mais um trimestre neste ano letivo atípico para escolas, professores, alunos e pais. Ninguém estava preparado para isto, no entanto e apesar dos contratempos cada profissional da educação tem feito um trabalho exemplar e merece ser reconhecido por todos. 

Portugal tem excelentes profissionais que se adaptam com facilidade às situações particularmente difíceis.

Como já escrevi anteriormente a mim enquanto professor custa-me imenso não poder ver a face das pessoas com quem trabalho, perceber as suas expressões. Passados mais de três meses sinto que não conheço os meus alunos nem os meus colegas. A Cecília foi infetada com Covid 19 em Novembro e ainda hoje diz que apenas recuperou ligeiramente o olfato e o paladar. É muito desconfortável estar a comer e não cheirar e sentir o paladar da comida.  Na escola sinto-me um bocadinho assim faltam-me os alicerces para construir com solidez a minha casa que abana quando há uma simples tempestade.

Não sei se até ao final do ano letivo vou sentir a escola e sentir mais estabilidade no meu edifício. Tudo irei fazer para que isso aconteça embora saiba as inúmeras dificuldades que me esperam. As horas que me faltam para acabar a formação são 502 e sinto a pressão do tempo escassear.  A diversidade de módulos e de conteúdos novos onde apesar de eu ter acesso a materiais passados por colegas, sinto que não tenho tempo para os trabalhar e adaptar à minha maneira de ensinar. Tudo isso a associar à distância de casa, à insegurança resultante da pandemia dificulta que eu consiga sentir-me bem em Grândola.

Tenho pena de não ter mais tempo para desfrutar da vila, de fazer uma visita à serra de Grândola ou simplesmente passear à beira mar nas belas praias da costa vicentina, pois apesar da distância faço questão de ir todos os fins de semana a Oliveira do Hospital abraçar o meu filho e dar uma ajuda à Cecília. 

Termino com os desejos de um Bom ano a todos os leitores do blogue.