segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Os CNO, o erro de Crato e o fim da educação para adultos em Oliveira do Hospital

Os CNO o erro de Crato

Os Centros de Novas Oportunidades (CNO) foram criados para reconhecer, validar e certificar competências e atribuir aos adultos que estavam há muito tempo divorciados da escola certificações parciais ou certificados equivalentes à conclusão do ensino básico e secundário. Creio bem que a ideia de reintegrar numa inovadora embora discutível filosofia de escola adultos que, por condicionalismos diversos da sua vida, perderam precocemente o contato com o sistema educativo, não deve ser glosada e desaproveitada. Muitos desses adultos abandonaram cedo a escola por dramáticas razões de ordem económica e social, a saber: graves dificuldades financeiras dos pais e/ou uma consciencialização deturpada sobre o valor real da escola, mas também uma desestruturação das suas famílias originada por divórcios, acidentes, doenças ou mortes precoces dos seus progenitores. E os CNO vieram proporcionar a esses adultos uma nova experiência académica que, em muitos casos, despertou os seus interesses culturais e reforçou os seus níveis motivacionais.

Porém, desde o seu início, o funcionamento dos CNO ocorreu no meio de grande polémica. Ou porque foram desmedidamente usados como propaganda eleitoral pelo histriónico PS de José Sócrates, que, na educação como noutras áreas, deu sempre mais importância à mediatização espetacular das estatísticas do que ao valor intrínseco e à avaliação efetiva das suas medidas políticas. Ou porque admitiram adultos demasiado jovens e sem experiência socioprofissional, que perceberam que os CNO lhes permitiam concluir o ensino secundário dispensando todas as dificuldades do ensino tradicional (a maçada das aulas a diversas disciplinas, as duras avaliações contínuas e sumativas, os difíceis exames, etc.). Ou ainda porque a multiplicação desregulada destes centros por todo o país, muitas vezes criados por entidades privadas e servidos por recursos humanos manifestamente impreparados e pressionados, no plano político e financeiro, pela vertigem do sucesso estatístico, simplificaram e banalizaram o que deveria ter sido um complexo e rigoroso processo de certificações.

Criou-se, assim, na opinião pública, a ideia risível de que estes centros se transformaram em verdadeiras fábricas de produção indiscriminada de diplomas do ensino básico e secundário. E que as «novas oportunidades» constituíam uma imerecida alternativa para os jovens adultos mais oportunistas, providos de currículos medíocres e de conhecimentos muito limitados, concluírem o 12º ano e até se candidatarem com êxito ao ensino superior. Generalizações perigosas, mas, porventura, compreensíveis, face à forma desastrada como este processo foi conduzido.

Terá sido também esta a interpretação do ministro da Educação Nuno Crato, do governo PSD/CDS, que por isso resolveu entretanto — e neste caso bem — repensar e reformular os CNO. Todavia, decididamente, neste país, nada se faz com racionalidade, método, transparência e uma atitude prospetiva. Muitos dos CNO promovidos por entidades privadas mas também a funcionar nas escolas públicas estão a ser abruptamente fechados, sem que, em alguns casos, sejam apresentados os fundamentos que sustentaram tais decisões. Assim aconteceu com o CNO da Escola Secundária de Oliveira do Hospital, no passado dia 1 de Fevereiro.

Esse organismo educativo tem desenvolvido, desde 2008, em condições difíceis, um trabalho rigoroso e frequentemente reconhecido pelas avaliações ou considerações externas de que já foi alvo, bem como pelos avaliadores externos que integram os seus júris de certificação. Nenhum dos seus formadores — aliás, na maior parte dos casos, com longos anos de experiência de ensino — se encontra vinculado a esse CNO em regime de exclusividade, continuando por isso contratados ao serviço da escola secundária, pelo menos até finais de agosto de 2012. Os quatro elementos da sua equipa técnica foram readmitidos em meados de dezembro de 2011, para cumprirem um contrato, suportado pelo POPH, com termo em 31 de janeiro de 2013, na sequência de um concurso público que o anterior governo deferiu e o atual governo nunca suspendeu (!).

Estando, por conseguinte, criadas condições humanas, financeiras e logísticas para que esse CNO continue a laborar, dando com isso continuidade a um trabalho credível que tem vindo a desenvolver com muitos adultos (quase 200) que aí se encontram inscritos e numa fase inicial, intermédia ou terminal do seu percurso, pergunta-se: porquê esta decisão extemporânea da tutela de indeferir e fechar este CNO neste exato momento, sem pelo menos prever um período de transição até à sua eventual extinção ou reformulação?

A pergunta é tanto mais pertinente porque se sabe que outros CNO, a funcionar em concelhos com características demográficas e socioeconómicas mais ou menos idênticas ao de Oliveira do Hospital, vão permanecer abertos. Mais: a pergunta é tanto mais pertinente porque o fecho imediato e definitivo deste CNO conduz a uma outra trágica questão que não parece preocupar o ministério da Edução deste Governo: se os cursos de educação e formação para adultos em Oliveira do Hospital estão também em vias de extinção, como poderão, futuramente, os adultos deste concelho aceder ao ensino básico e secundário?

Um dos muitos problemas da nossa democracia continua a ser o abismo colossal que separa os políticos com responsabilidades de governação do mundo real. A incapacidade desses nossos políticos para abandonarem a platónica «caverna» onde vivem (leia-se os seus gabinetes climatizados e, presumo, repletos de secretários zelosos e dossiers cheios de orientações macroeconómicas neoliberais, localizados nas zonas privilegiadas da velha e presunçosa «capital do império») e mergulharem no «mundo das ideias» – esse mundo real e bem difícil de enfrentar onde todos os dias labutam arduamente os cidadãos comuns de um Portugal profundo, desertificado, esquecido e abandonado pelos «estadistas» de Lisboa.

Luís Filipe Torgal

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