domingo, 12 de setembro de 2010

O Professor Jerónimo Sanches Pinto

Na passada semana com a preciosa ajuda da minha namorada calcorreámos os meandros dos rios Alvoco e Alva, que escondem uma beleza asfixiante, apenas sentida quando se cheira, absorve os seus aromas e a cultura das suas gentes.
A visita começou em Avô, uma vila muito bonita, localizada junto às margens do rio Alva, estava frio e uma humidade intensa no ar. O início do périplo em Avô ocorreu devido a um dos temas a desenvolver na tese de mestrado ser a extracção de minério pelos romanos, sendo Avô um dos expoentes da passagem romana no concelho. O expoente máximo é sem dúvida a Bobadela, que nessa altura era equiparável a localidades como Aeminium (Coimbra) e Conimbriga (Condeixa).
Após questionarmos alguns transeuntes que passavam decidimos ir à junta de freguesia local, onde nos indicaram a casa do professor Jerónimo Sanches Pinto.
Chegados à casa do professor, tocámos levemente à campainha com receio de podermos importunar uma pessoa que nos foi dito já deter uma certa idade. O professor abriu-nos a porta e após termos explicado o fim da nossa visita expressou um sorriso sincero e humilde. Pediu-nos uns minutos aparecendo pouco depois com um conjunto de livros sobre a cultura e as gentes de Avô que ele citou com uma naturalidade e entusiasmo contagiantes. O diálogo prosseguiu com uma leveza não transparecida nos seus 91 anos de idade, sabe bem conversar com uma pessoa que dá valor à sua terra, onde criou raízes e conhece como ninguém. Aprecemo-nos da emoção que latejava da sua face à medida que soletrava poemas de Brás Garcia de Mascarenhas ou expunha o imenso trabalho que realizou em prol da valorização da sua freguesia.
Nestas alturas constato que no Mundo de hoje, já não há pessoas destas que se abrem de uma forma tão espontânea, sincera o seu coração e transparecem uma ligação de amor e valorização de um património que eles consideram seu. Devido à tristeza de observar que o seu trabalho não teve a continuidade desejada observou com uma alegria adicional a nossa visita.
Durante os momentos da conversa que enveredou por uma extensa diversidade de caminhos, questionámo-lo sobre a localização dos principais vestígios romanos, indicando-nos imediatamente a localização de duas calçadas romanas: uma com destino à Aldeia das Dez e outra a Foz de Arouce (freguesia do concelho da Lousã) e Aeminium (Coimbra). Denotámos no seu olhar e nas suas palavras a mágoa que devido à sua idade avançada, assim como a doença que exaspera a sua esposa, que infelizmente conduziu para uma cadeira de rodas e para a necessidade de uma atenção permanente, não nos poder mostrar pessoalmente a riqueza do património que subsiste na sua vila.
A viagem prosseguiu com o reconhecimento das duas calçadas romanas inferidas pelo professor onde lamentavelmente denotámos a inexistência de qualquer sinalização mais detalhada que pudesse transparecer a importância daquelas pedras lacrimejadas no solo possivelmente por escravos romanos para servir o seu poderoso império. A única indicação observada foi num dos troços o nome da rua designar-se “Estrada Romana”.
Nesta fase o céu começava a escurecer e os aguaceiros já encobriam a bonita Serra do Açor. Fomos almoçar a Aldeia das Dez onde apesar do frio e da chuva pudemos observar a bela paisagem circundante. É nestas alturas, que apetece que o tempo pare por momentos e nos deixe inspirar e contemplar a magnificente paisagem que nos rodeia.
Após o almoço deslocámo-nos para o cerne da minha tese de mestrado, o vale do rio Alvoco que vai desaguar no rio alva, na Ponte das Três Entradas, nascendo na Serra da Estrela junto a Alvoco da Serra. Deslocámo-nos em direcção a Vide local onde eu sabia da existência de conheiras, ou seja locais planos onde os romanos faziam outrora a lavagem do xisto e quarzito para uma posterior extracção do ouro. A observação dos conhais é ainda possível pois a área em causa não sofre a influência humana, sendo ainda possível observar os amontados de pedras deixados pelos romanos após procederem à sua lavagem.
Este é um local que eu terei que voltar futuramente, investigando-o com mais atenção e pormenor. Desta forma deixo o meu primeiro testemunho sobre a presença romana no vale do rio Alvoco e Alva que teve como personagem principal o professor Jerónimo.

1 comentário:

Sérgio disse...

Caríssimo,

O contacto com eruditos locais é, de facto, um excelente meio para saberes ao que vais, o que existe, o que se diz e, até, o que se escreveu.

Recomendo-te, também, que consultes uma carta arqueológica do local (se existir, claro). Ou que tentes falar com o arqueólogo da Câmara para se saber se já se efectuaram escavações ou sondagens nos perímetros que te interessam.

As monografias locais, embora possam conter erros sérios, podem, até pelo erro propriamente dito, dar algumas luzes.

Aquele abraço,

Sérgio.