sexta-feira, 1 de julho de 2011

Temos governo

A leitura do post do Tiago inspirou-me não para um comentário mas para uma nova entrada.

Não há nada neste governo que me deixe descansado e o passar dos dias (que farão as semanas e os meses...) só confirma as razões da inquietação. Os problemas do país estão identifcados, não é um problema de desconhecimento e não há possibilidade, a menos que sejamos muito ingénuos, de as abordagens para uma hipotética (cada vez menos real) solução ou mitigação dos problemas, ser meramente técnica e não trazer consigo um projecto social. Entendamo-nos: o discurso científico não é monista e, como tal, o discurso sobre os assuntos da polis também o não pode ser. É epistemologia básica. Os media, na sua estupidez ou no seu discurso formatado, referem expressões como «os economistas defendem, afirmam...». Que economistas? Quem são, todos? A resposta, embora desnecessária, é óbvia: os economistas não pensam todos da mesma forma porque a economia enquanto ciência social é um discurso construído sobre uma certa parcela da realidade não é imutável nem neutra. E, mais do que uma ciência pura, desprovida de preconceitos, é uma economia política . Se o discurso da economia fosse unívoco e infalível estaríamos mais na base do dogma teológico e não do conhecimento humano. E como as decisões sobre o social implicam consequências, importa ver quais são as opções: são elas que denunciam ao que viemos e o que pretendemos.



E o que este governo quer é simples: operar uma tranformação radical, eliminando qualquer coisa que lhe possa cheirar a social democracia (não vou sequer perder tempo a explicar que o PSD não é social democrata mas sim um partido da chamada nova direita ou não estaria no grupo parlamentar do PPEuropeu em Bruxelas, só por exemplo) e que o seu discurso social não invalida nada do que aqui se diz, pelo contrário, vai no mesmo sentido.

A intervenção social que o PSD e o CDS defendem é o da caridadezinha, ou seja, remeter os direitos sociais (saúde, pensões, educação) para a esfera da esmola e da pretensa boa vontade dos endinheirados que através de fundações, vouchers, fundos e bolsas diversas premeiam os «bem-comportados» que sabem o seu lugar e se «esforçam». Supostamente, a demissão social do Estado pouparia dinheiro e traria mais resultados. Está aí o exemplo dos EUA para mostrar que não: na saúde, por exemplo, não só os gastos são exorbitantes com um sistema privado como deixam uma parcela imensa da população afastada de quaisquer cuidados de saúde. Ainda há pouco um artigo de Krugman no i abordava esta questão.

Quanto às preocupações com o interior despovoado, a produção nacional, e outras coisas absolutamente vitais mas tornadas «fofinhas» em discursos ocos de Cavaco, que se pode dizer? Cavaco, um dos iniciadores do desmantelamento das pescas e da agricultura num processo de integração dependente na CEE/UE tem de ter muita lata para agora cobrar isto num estilo, «eu bem avisei» e vir professoral e paternalmente dirigir-se ao seu séquito de rapazes mal-comportados, os tugas!

E sobre isto que pode um governo de fundamentalista do «laissez faire» fazer ou, melhor, «não fazer»? Como pode querer defender a economia nacional com as privatização dos últimos sectores estratégicos, entregando-os baratinhos ao capital estrangeiro (ah, o capital não tem pátria!) Velhas perguntas com velhas respostas!


Só o afã liberal deste governo é novidade. Tudo o resto é disco estragado: o discurso da responsabilidade, do interesse nacional, as promessas (quebradas a cada hora), a incoerência dos discursos com as práticas. É a continuação da degradação da democracia, do assalto ao Estado pelos grupos económicos e financeiros parasitários, agora talvez com mais rapidez e entusiasmo ministerial.

1 comentário:

Tiago Sousa disse...

Apesar alguma ignorância devido ao ainda desconhecimento daquilo que o novo governo pretende não deixa de me intrigar algumas ideias soltas que eu tenho conectados e que me soam a politicas que reforçam e adicionam medidas à austeridade do memorando da "troyca".

É com apreensão que eu vejo o aumento dos impostos e a penalização do subsídio de natal.

Isto é o principio de uma avalanche de políticas que poderão ter como consequência a redução do défice a curto prazo mas a recessão a médio e longo pois o país vai deixar de produzir riqueza.

Sinto o país demasiado limitado às políticas europeias que restringe a evolução e o progresso.

Enfim uma ligeira visão sobre o nosso governo.