sexta-feira, 22 de outubro de 2021

A menina do 2º ciclo

Este ano letivo estou a lecionar no Plano Casa.

Comecei há cerca de duas semanas e a minha tarefa é dar apoio a uma instituição de acolhimento de raparigas que são retiradas ao seu lar familiar por diversos motivos. 

Quando entrei lá no primeiro dia observei um meio calmo, estranhei um pouco confesso. A Educadora muito simpática, afável e sempre com um sorriso na cara. Para ser Educadora numa Instituição de acolhimento de crianças é preciso gostar mesmo daquilo que se faz e dedicar-se de corpo e alma a uma causa tão nobre, admiro-a muito por isso.

Sobre o meu primeiro dia, lembro-me de uma conversa que a Educadora partilhou comigo enquanto eu estava a dar apoio na sala de estudo. Ela indicou-me as peripécias que tinha tido durante a madrugada onde teve que ir buscar uma residente da casa a um hospital de Lisboa em consequência dos excessos cometidos, lembro-me perfeitamente da expressão dela sobre a sua menina "Ela está a fazer mal a ela própria".

O apoio que eu faço é muito generalizado e acabo muitas vezes por divagar por caminhos das vidas das educandas. Uma delas ainda no segundo ciclo quando eu lhe coloquei um mapa de Portugal, perguntei-lhe onde era Lisboa, ela não me conseguiu dizer onde era, indicando-me que gostava de ir ao Porto, pois tinha lá um irmão ou um primo. Acabei por dizer-lhe onde era Lisboa e ela conseguiu depois dizer onde era o Porto. Aquando da conversa disse-lhe que o Porto ficava muito distante do local onde ela se encontra, cerca de 5 horas de carro. A menina dizia muitas frases repetidamente "pois é muito longe" "gostava muito de lá ir".... Notei um discurso vago e vazio. Percebi imediatamente a falta de bases e alguém que lhe indicasse um rumo. Devido ao pouco acolhimento para a minha presença  das restantes educandas voltei à menina do segundo ciclo no segundo dia e entre a realização dos exercícios de Português íamos divagando por histórias da sua vida que eu levanto aqui um pouco da ponta do véu. Eu percebi que ela de 15 em 15 dias já vai a casa de familiares e subentendi a sua  da vontade de sair daquele espaço e voltar para a família. Não percebi se ela gostou de estar em casa dos familiares no fim de semana, pois enquanto falávamos deixou escapar a expressão "felizmente ou finalmente (não me recordo ao certo) voltei para a instituição". Sinto quando falo  com ela no seu tom monocórdico e pouco expressivo que ela ainda não está preparada para estar ali e o lar familiar também não será o local ideal. Assustou-me ouvir repetidas vezes ela dizer "Eu quero seguir a minha vida, eu não quero ser como as outras meninas". Quando ouvi dizer a primeira vez fiquei contente, mas quando a ouvi dizer quatro vezes fiquei preocupado. Após as sucessivas repetições senti que não era ela a pensar mas uma cartilha que lhe foi comunicada e ela segue-a sem perceber bem o seu significado. Na instituição sinto-a isolada e perdida. No terceiro dia eu propositadamente não fui ter com ela. Quando faltava pouco mais de meia hora para me ir embora veio ter comigo olhou para o meu telemóvel observou o meu filho e a partir daí decorreu mais uma conversa espontânea.

Fico por aqui nesta minhas novas experiência como professor.

 

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